O Método
e a Organização de Um Programa de História Africana
A
idéia principal atrás do nosso programa de Historia Africana é
possibilitar uma melhor compreensão da participação material,
cultural e intelectual dos Africanos e Afrodescendentes na sociedade
brasileira colonial e pós-colonial. O nosso enfoque não é o da
contribuição africana para a cultura brasileira, mas da participação
da cultura africana na cultura nacional [Depestre-86]. Da forma
que a idéia de contribuição tem sido desenvolvida, a cultura brasileira
fica representada como um prolongamento da cultura Européia com
alguns adereços das culturas Indígenas e Africanas. Postura da
qual discordamos profundamente e consideramos não apenas equivocada,
mas como eurocêntrica e, por vezes, racista. Conceitualmente vamos
considerar a introdução dos elementos culturais Africanos no Brasil
sob a idéia de reinterpretação [Cunha Jr., 96]. Neste conceito
a diversidade Africana vai se confrontar com as diversidades Indígenas
e Européias, em um novo contexto histórico: o do escravismo e
do capitalismo racista no pós-abolição, produzindo nova síntese
da base Africana. O processo cultural é visto como constantemente
dinâmico, sendo portanto, todas as aquisições culturais provisórias
e em transformação.
Os
métodos da Historia Africana são geralmente guiados por duas grandes
correntes: as baseadas no conceito de raça [Asante, 80], [Wflfiams-76]
e as fundadas em etnia [Diop, 87], [Rodney, 75], [Bernal, 87].
A evolução dos estudos africanos e da Historia Africana nos Estados
Unidos fica esquematicamente, em nossa classificação, dividido
em três grupos: os de base africana, os afrocêntricos e os eurocêntricos.
Nós acreditamos que na realidade as opções sejam mais amplas.
Na nossa perspectiva, acreditamos que as opções cêntricas (Afrocêntricas
e Eurocêntricas) sofram das mesmas precariedades e induzam interpretações
excludentes da história. Desta maneira, o enfoque aqui escolhido
é o da etnia e o de base africana. A vertente da base africana
se explica pelo próprio percurso da historia africana, que se
dá pela comunicação com outros continentes e pela incorporação
de outras culturas sem nenhuma centricidade [Bernal, 87], [Sertiman,].
As centricidades, tanto na cultura africana como na européia são
apenas produto de construções ideológicas de projetos de dominação
e de alienação. Embora tomamos de início a fundamentação do materialismo
histórico, o fundimos com o humanismo africano nos aspectos teóricos
e metodológicos.
Uma
boa amostra de programas e bibliografias de ensino da Historia
Africana são apresentados em Smith [Smith, 93]. A nossa proposta
de programa não tem um enfoque cronológico e se inicia pelo presente
Africano e pelas Africanidades no Brasil. Os motivos desta inversão
são explicados em artigo anterior [Cunha Jr., 97]. Para a introdução
da Historia Africana se faz necessário uma exposição da geografia
física e humana africana que é realizada no segundo tópico do
programa [Sebastião, 87], [Cunha Jr.,91]. A terceira parte tem
como finalidade mostrar que a humanidade tem sua origem na África
e que revoluções técnicas importantes para a nossa evolução aí
ocorrem [Diop-74]. A organização dos tópicos seguintes é realizada
por blocos regionais. A quarta parte trata da região do vale do
Nilo. A quinta parte procura demonstrar a unidade cultural da
África [Diop-76]. Procura desfazer as posturas que dividem a África
em Norte e Sul do Saara, ou em África Árabe e Negra. Utiliza principalmente
a expansão da tecnologia do ferro sobre todo o continente para
mostrar sua integração e existência de povos com grau avançado
de civilização material em todo o continente e não apenas em regiões
isoladas como habitualmente se acredita [Cunha Jr.-91]. Continua
o tópico mostrando a África integrada em outros continentes por
rotas comerciais e viagens de navegação através do Indico e do
Atlântico [Sertiman- ]. Explora a Idéia dos Africanos visitarem
periodicamente a América anterior a Colombo. Termina com idéias
filosóficas e cosmológicas Africanas [Alpha-77]. O sexto item
organiza as idéias sobre o norte Africano e introduz a expansão
Islâmica através do continente [Vargens, 82]; [Fage-87]. O sétimo
tópico trabalha as Civilizações do Rio Niger e destaca a importância
destas para o Brasil devido às populações que para aqui imigraram
sobretudo no último período do escravismo [Achebe, 58], [Ki-Zerbo,
81], [Depestre, 82]. O oitavo tópico destaca a penetração e desenvolvimento
do Cristianismo na África entre os séculos 8 e 12. Também faz
ligação da região com o mundo Árabe, a Mesopotamia e a Índia.
Na nona parte temos as Civilizações do Rio Zambeze e destacamos
a intensa atividade de mineração da região [Hoflisso-87]. A décima
parte apresenta a Cultura Bantu [Jahn-90], [Altuna-85], [Lopes-
], embora povos de língua Bantu já tenham aparecido no item anterior.
Esta parte também discute a questão da penetração portuguesa no
continente Africano, assim como a resistência às agressões externas.
O programa é terminado com retrospectiva da arte da África e dos
elos de ligação entre historia Africana e Brasileira [ Alpha-77],
[Araujo-88], [IBEA-77], [Gerdes- 90] ,[Calaca-97].
O
programa que segue é previsto para uma carga horária de 60 horas.
Nestas 60 horas cada um dos tópicos recebe um detalhamento maior
não descrito aqui por motivos de espaço. Em diversas ocasiões
oferecemos este programa numa forma simplificada com tempo de
duração entre 30 a 40 horas para ser desenvolvido numa semana
de curso intensivo.
Programa
da História Africana para Educadores
l
- Introdução ao Programa
Propósitos c metodologia. Africanidade e Afrodescendência Brasileira.
Cidades Africanas e Estados Africanos Atuais.
Fontes Documentais da História Africana: Arqueológicas, Orais,
Escritas, Musicais.
As Línguas Escritas do Continente Africano.
2
- Geografia Africana
Bacias fluviais Africanas. Mudanças Fluviais e Mudanças Climáticas.
Vegetação c Relevo do Continente. Climas Temperados e Regiões
Montanhosas.
Ocupação Populacional e Possibilidades de Vida nas Regiões Desérticas.
Regiões e Povos Africanos. África Austral . África Oriental. África
do Norte. África Ocidental.
Matrizes Lingüísticas e Línguas Africanas.
3
- África: o Berço da Humanidade
A Evolução da Espécie Humana. A Idade da Pedra e Povos Coletores.
Organização da Agricultura na África. Comunidades Pescadoras.
4
- As Civilizações do Nilo
O Povoamento da Região do Nilo.
O Egito Antigo. Núbios . Meores. Axums.
A Continuidade Egípcia.
A Idade do Ferro na África.
5
- A Unidade Cultural Africana
A Expansão Populacional Africana.
A Expansão da Tecnologia do Ferro como Exemplo da Unidade Cultural.
A Integração Comercial Africana pelas Rotas de Caravanas.
A Integração da África com Outros Continentes.
As Concepções de Mundo na África.
6 - Os Povos do Norte Africano
Os Almoravides.
Os Tuareges.
Os Berberes.
Povos Invasores no Norte Africano.
A Expansão Islâmica.
7
- África Ocidental
Produtos Comerciais da África Ocidental. Ouro. Sal. Nós de Cola.
Peixe.
Império de Gana.
Império do Mali.
Império Songai.
Hausa, Iorubas e Asantes.
As Invasões Européias e Tráfico de Cativos Africanos.
8
- África Oriental
Axum e Etiópia.
Da expansão do Cristianismo no Século 8 às Cruzadas Negras.
Os Estados Suarilis.
9
- África Austral
A produção de Ferro e Ouro na Região.
A ligação Comercial com a Região Suarili.
O Grande Zimbábue.
O Estado Mutapa.
Os Povos e Estados Litorâneos.
A Presença Portuguesa na Região.
Os Reinos Zulus, Chonas e Khosas.
As Invasões Inglesas e Holandesas.
10
- As Culturas Bantos e Filosofia Bantu
Os Reinos do Congo.
O Império Lunda.
O Inicio da Expansão Invasora Portuguesa.
A Resistência, a Expansão Portuguesa e o Tráfico de Cativos Africanos.
11
- Historia da Arte e da Arquitetura Africana
Arte na Pré-história Africana.
Arte e Arquitetura no Sudão e no Egito.
Arte e Arquitetura nas Civilizações do Niger.
A Estatuária da Cultura Banto.
As Figuras Geométricas nas Culturas Africanas.
As Jóias e Estatuária Africana na Coroa Portugusa do Século 14.
Os Sentidos da Arte Africana e a Herança Brasileira.
As Recriações Africanas nas América.